“Esse cara aqui não sabe nada”, diz o candidato. Qualquer candidato (Reuters)
WASHINGTON – Um Obama mais ativo e combativo e um Romney igualmente incisivo se apresentaram na noite de terça ao eleitorado americano. Mais do que o estilo dos candidatos, o que diferenciou o segundo debate entre os presidenciáveis americanos foi a substância.
Tanto o presidente democrata quanto seu oponente republicano foram muito mais detalhistas e assertivos em suas respostas do que no primeiro confronto, quando se limitaram à troca de acusações e explanações generalistas.
Os dois candidatos, por exemplo, dedicaram um longo tempo à sua política energética — um pilar para a retomada econômica em ambas as plataformas. Ambos insistem no binômio petróleo-gás natural. Obama o completa com as chamadas energias limpas, que ainda carecem de desenvolvimento tecnológico para baratear sua produção em larga escala, e Romney prefere retomar a aposta em carvão, que polui muito, mas contenta eleitores em importantes Estados produtores como Ohio.
Os dois também foram mais detalhistas em seus planos de empregos, Romney deixando claro que seu foco serão as pequenas empresas e incentivos tributários, Obama falando em poder de consumo da classe média e investimento em educação e tecnologia.
Foi um debate mais denso, até agressivo, mas com trocas de acusações muito mais embasadas na realidade do que as infantiloides discussões do primeiro confronto, na linha do “o plano dele é mais feio que o meu”.
Isso dito, o confronto foi vencido por Obama, segundo todas as pesquisas publicadas até agora. Eu concordo. Mas foi uma vitória bem mais discreta do que a lavada de Romney no primeiro debate, quando o presidente se mostrou amuado, como se lhe faltasse pulso. Desta vez, não. Seus reflexos retóricos estavam bem polidos e ele parece ter domínio total de seu discurso.
Romney tampouco se abateu, embora tenha lhe faltado o charme e senso de humor do embate anterior. Mas o republicano perdeu o rebolado justamente na pergunta que tinha tudo para levar vantagem: sobre a Líbia.
O governo Obama só fez papelão no episódio envolvendo o assassinato de seu embaixador Chris Stevens em Benghazi. Em vez de se ater à crítica sobre as idas e vindas e despreparo do governo para a situação, Romney se lançou, como num eco bushista, num ataque à não descrição do episódio como ato terrorista.
Insistiu que Obama não tinha usado a expressão, deixando fácil para o presidente rebater pedindo a transcrição de seu pronunciamento do dia seguinte ao caso. Estava lá, “ato terrorista”. O erro de Romney acabou norteando a discussão, que deveria ser sobre planejamento e segurança. Seu vice, Paul Ryan, foi muito melhor nessa discussão com Joe Biden.
Obama também fez sua parte para virar o jogo neste assunto: após mandar como bois de piranha a embaixadora na ONU, Susan Rice, e a secretária de Estado, Hillary Clinton, resolveu dizer que a responsabilidade final era sua. Uma espécie de ªthe bucket stops hereº: “Sou eu que recebo os caixões”, na versão obamista. Pegou bem. A plateia gostou.
O democrata também soube explorar os pontos frágeis de seu adversário: sua preconceituosa política de saúde para mulheres, a questão do corte de impostos para os mais ricos (nessa resposta Romney conseguiu se defender, ao priorizar as microempresas) e sua frase divisiva sobre os 47%, sua defesa da bancarrota das montadoras americanas e sua falta de maior especificidade no plano de empregos.
Romney, por sua vez, atacou as incoerências de Obama sobre imigração, o fato de ele ter expandido o deficit quando prometera cortá-lo, o desemprego mais alto entre as mulheres e a lentidão dos avanços dos últimos quatros anos.
Embora as acusações de Romney nesses pontos sejam verdadeiras, soaram repetidas, o que parece explicar por que o presidente foi preferido pela plateia, mas teve vantagem pequena — quase na margem de erro na CNN e na margem de erro na CBS.
Se isso terá impacto nas pesquisas como teve o primeiro debate, que alimentou uma arrancada de Romney, eu fico com a análise do sempre sóbrio David Gergen, analista conservador-moderado da CNN: o desempenho de Obama não foi estrondoso a ponto de dar-lhe gás para abrir de novo a vantagem perdida, mas foi bom o suficiente para conter o avanço de Romney.
Ou seja: nos próximos 20 dias, salvo surpresas, devemos ter uma corrida rigorosamente empatada.
Finalmente, uma nota sobre a mediadora, Candy Crawley. Sou fã da apresentadora da CNN, mas neste debate ela pisou na bola, com o pior desempenho até agora. Teve dificuldades para interromper Romney e Obama — e muito mais o segundo do que o primeiro.
Apesar de algumas boas intervenções para contrapor as promessas dos candidatos à realidade, o que ficará para os registros será que Crawley deixou Obama falar quase quatro minutos a mais do que Romney, ou quase 5% do tempo total do debate. Imperdoável.
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Na próxima segunda, os candidatos se enfrentam em Boca Raton, na Flórida, para o derradeiro debate, sobre política externa. Estarei lá. As chances de que ele altere as pesquisas, porém, é mínima: menos de 4% dos eleitores colocam o assunto entre suas prioridades nesta eleição, e a relação com a China, o grande fantasma desta campanha, será alvo de apenas um dos seis blocos.