Obama na ONU
27/09/12 08:22EM TRÂNSITO* – Barack Obama fez um discurso bonito na última terça na ONU, surpreendentemente conciliador (dado que ocorre tão pouco tempo após a eclosão dos protestos antiamericanos no Oriente Médio) e, ainda assim, firme em defender as ideias americanas.
Além de pedir tolerância, cobrou também coerência (“O futuro não pode pertencer àqueles que difamam o profeta do Islã. Para que tenham credibilidade, porém, os que condenam essa difamação também devem condenar o ódio que vemos quando a imagem de Jesus Cristo é profanada, igrejas são destruídas, o Holocausto é negado”) e união (“juntos, podemos trabalhar por um mundo onde somos fortalecidos por nossas diferenças, e não definidos por elas”).
O presidente-candidato marcou as posições de Washington (ou, ao menos, de seu governo), disse que o futuro, no conflito israelo-palestino, não deve pertencer àqueles que dão as costas à perspectiva de paz (o que soou como uma leve alfinetada em seu rival republicano) e tentou pintar um quadro no qual o copo, no Oriente Médio, está meio cheio, já que líbios, egípcios e tunisianos agora votam.
Escaldado por quase quatro anos de Casa Branca, admitiu também que democracia não se resume ao direito de votar.
Arrisco dizer que foi um dos melhores discursos que Obama já fez, resgatando o tom perseverante do início do governo, mas tornando-o um pouco mais sóbrio, amadurecido pela experiência no poder.
Não necessariamente essa evolução condiz com a evolução de sua política externa. Suas ações, nesse campo, sempre me pareceram menores do que suas palavras, e, depois de quatro anos, parece ser esta a percepção dominante ao redor do mundo (especialmente no Oriente Médio).
O centro de pesquisas Pew, um dos mais respeitados e equilibrados dos EUA, fez seu levantamento sobre atitudes globais e captou que a avaliação do presidente americano — se a política externa dele levou em conta o interesse de outros países, se ele tem sido equilibrado na questão israelo-palestina — não é das melhores. Há uma clara decepção.
(A notar: os brasileiros são os mais otimistas na pergunta sobre Obama levar em conta seu país, com 55% de respostas positivas. Só os chineses foram também majoritários no “sim”, com 51%, mas aí desconfio que o motivo seja a rixa entre os dois.)
Mesmo assim, em muitos lugares — sobretudo na Europa — ainda há apoio à sua tentativa de reeleição. A exceção é o Oriente Médio, onde a opinião geral é a de que o democrata não merece outro mandato (a pergunta foi apenas focada em Obama, não houve menção a Mitt Romney como alternativa).
Nesta semana, também, o Gallup divulgou um levantamento segundo o qual o percentual de americanos que afirma que confia no governo para solucionar os problemas externos é o mais alto desde 2003, quando eclodiu a guerra do Iraque (66%).
Deixada de lado durante a maior parte da campanha, a política externa será tema do terceiro dos três debates entre Obama e Romney, na Flórida, em 22 de outubro.
(* trabalhando em uma reportagem especial em outro Estado — posts a respeito virão após meu retorno)
Desculpe, apareceram agora como aguardando moderação! Desculpe mesmo, favor desconsiderar este e a ultima pergunta!
Deixei alguns comentários aqui ontem, não os encontro. Estão em algum lugar específico do post?
Desculpe, Beatriz, esta semana foi confusa, só liberei agora. Abs.
Quanto ao filme anti-islã ser um produto de extremistas, não representativo, também concordo, mas não foi isso que quis dizer. Talvez eu tenha me expressado mal. Penso que extremistas nascem de situações extremas. O Holocausto foi (e sempre será) uma situação extrema – e a Hebraica de São Paulo tem até detector em raio-X pra visitantes. O evento de 11 de setembro de 2001, nos EUA, foi um evento extremo (não igualmente, mas extremo). Durante muito tempo a conduta americana em relação aos muçulmanos (interna e externamente ao país) foi de segregação, de fomento ao preconceito e mitificação. Artefatos muito uteis na formação de extremistas. Assim, não considerei a produção do filme como representativa de um sentimento islamofóbico por toda a nação americana, mas produzido por ela e efetivado por um pequeno grupo extremo. É nesse sentido que responsabilizaria essa política norte americana de segregação, pelo sentimento islamofóbico, esse sim bastante difundido (pense no porque Guerra ao Terror levou tantas estatuetas no Oscar de 2010)
Concordo que esse tipo de política — guerra ao terror — alimenta o extremismo dos dois lados, mas não vejo o filme como um produto dela. Talvez o sentimento anti-islã tenha dado uma janela para ele aparecer, mas, da mesma forma, o sentimento anti-EUA no Oriente Médio acabou escancarando essa janela e divulgando mais ainda uma produção obscura, o que é um contra-senso…
EUA estao d olho é no petroleo IRANIANO
A guerra gera d uma maneira complexa um ciclo de destruição/reconstrução que faz girar a roda d varias industrias (armamentos, construção civil, industria farmaceutica, entre outras), alem de permitir a apropriação das riquezas dos paises conquistados, sendo portanto conveniente ao regime capitalista, em especial nos momentos de crise economica aguda e prolongada, sem perspectiva de solução a curto prazo, como a crise q hoje assola os EUA e a Europa
Não me parece que os americanos teriam fôlego para uma guerra agora, por mais que tivessem interesse no petróleo iraniano. A questão ali é muito mais complexa do que petróleo, e envolve estabilidade regional e divisão de poder. Obviamente aos EUA não interessa um Irã poderoso, mas tampouco eles estariam em posição agora de arriscar um novo conflito ali. Abs.
Gostaria de saber a opinião do autor sobre a atitude das delegações dos EUA, Israel e outras em ausentar-se (e dar a isso o nome de boicote) durante o discurso de Ahmadinejad, na Assembléia Geral da ONU, esta semana, levando em consideração dois pontos importantes para mim:
que a justificativa pela ausência relacionou-se com a visão contra-Israel que o Irã sustenta, onde esperava-se que o líder iraniano pudesse, mais uma vez “proferir teorias paranoicas e insultos repugnantes contra Israel.”, como divulgou a grande mídia;
e o sentimento islamofóbico criado, a partir do evento de 11 de setembro de 2001, onde o “filme anti-islã” (termo também empregado pela Mídia), pode ser interpretado como resultado deste processo de mitificação cultural dos muçulmanos e, portanto, de responsabilidade americana e israelense.
Atenciosamente.
Beatriz, eu não acompanhei o discurso do Ahmadinejad para opinar. Se ele de fato voltou a negar o Holocausto ou dizer que Israel deveria ser apagado do mapa, a ausência me parece justificada. Por outro lado, concordo com você que exista islamofobia nos EUA — embora eu não atribua a ela esse marcação de posição na ONU. Também não acho que o filme anti-islã que alimentou os protestos no Oriente Médio seja um bom exemplo disso, pois ele me parece um trabalho de extremistas, e dizer que todos os americanos pensam desse jeito é uma leviandade tão grande quanto dizer que todos os muçulmanos são radicais. De qualquer forma, existe, sim, preconceito contra os muçulmanos nos EUA, haja vista o fato de o próprio Obama já ter sido obrigado a desmentir que fosse muçulmano, como se isso fosse uma ofensa. A meu ver, o que falta é educação sobre o assunto de ambos os lados. Abs.
Olá Luciana. Muito abrigada pela resposta!
Hoje, coincidentemente, estive lendo um artigo intitulado “Me segurem!”, escrito por Uri Avnery, em 2010. Ele comenta brevemente sobre como, em 2010, o jogo político de sanções ao Irã parecia fadado ao fracasso. Dizia que esta estratégia, que visaria enfraquecer o país economicamente e, assim, garantir uma vitória numa eventual guerra, não funcionaria neste caso porque o domínio do petróleo iraniano desestabilizaria tanto os EUA e a UE que nenhum dos dois concordaria em apoiar a iniciativa israelense.
Hoje, dois anos depois, aqui na Folha, vemos que, tristemente, Uri foi ligeiramente ingênuo: “O inimigo impôs sanções contra a venda de petróleo e, pior ainda, sanções contra os intercâmbios bancários para que não conseguirmos repatriar o dinheiro se vendermos petróleo. É uma guerra encoberta em escala planetária” (Ahmadinejad: http://www1.folha.uol.com.br/mundo/1162562-presidente-do-ira-diz-que-ocidente-faz-guerra-economica-com-sancoes.shtml ). Isso porque houve uma desvalorização de 20% na moeda iraniana em 2 dias, resultando desta campanha massiva de boicotes que foi, sim, aderida tanto por EUA quanto pela UE. Uma desvalorização enorme, numa velocidade assustadoramente rápida pra consequencias economicas cujo reparo será assustadoramente demorado.
Se levarmos em consideração que Sanções e Boicotes são uma manipulação silenciosa do cenário geopolítico (como no BDS), e que a instabilidade economica (iraniana) seria uma das poucas formas de os EUA apoiarem uma guerra entre Israel e Irã, o boicote ao discuso de Ahmadinejad na Assembléia Geral da ONU não seria uma atitude coerente com o boicote economico e, portanto, uma forma oficial de forçar uma Guerra?
Beatriz, não acho que nem um nem outro sejam meio de forçar uma guerra. As sanções são uma punição, e podemos discutir sobre a eficácia, se são justas e quem prejudicam. Mas não acho que sejam forma de forçar uma guerra. São,isso sim, uma forma de forçar pressões internas contra o atual governo. Não encaixo o boicote ao discurso aí. Mas, de novo, não ouvi os discursos. O Ahmadinejad ficou para o discurso do Netanyahu ou o boicotou? Abs.