Debate dos sete erros
23/10/12 22:24WASHINGTON – As pesquisas indicaram que o presidente Barack Obama venceu o debate sobre política externa (a margem varia conforme o instituto), e que Mitt Romney teve um desempenho passável.
Como eu não acho que esse debate fará muita diferença no resultado eleitoral a favor de um nem de outro, até porque o eleitorado americano se mostra pouco interessado em política externa, vou pular a parte sobre consequências do debate.
Algumas coisas, porém, me chamaram a atenção durante a cobertura, a ver se os leitores concordam.
1) No fim, a substância do debate vale menos do que o teatro que ele representa, e na noite de segunda o presidente estava mais confortável do que seu oponente. De qualquer forma, a performance de Romney não foi o desastre, em termos de estilo, que foi a de Obama no primeiro confronto;
2) Humor vale muito, sobretudo em TV. Se Romney se mostrou inspirado no primeiro debate, neste terceiro foi a vez de Obama. Acho que foi na medida. Sim, é deprimente que estejamos falando de humor em um debate presidencial, mas é notório que ele tenha sido uma tática dos dois candidatos (nenhum dos deles, aliás, conhecido pela verve cômica);
3) Romney está precisando de lições de geografia. Dizer que a Síria oferece ao Irã saída para o mar (alô, governador, golfo *PÉRSICO*) ou que indiciará o iranianos Mahmoud Ahmadinejad por genocídio (onde mesmo? no tribunal penal internacional, dos quais os EUA não são signatários?) foi um pouco além da conta;
4) Ninguém sabe o que fazer com o Irã. Nenhum dos dois candidatos quer guerra, mas os dois não descartam a hipótese se a situação apertar; ambos defendem sanções mais duras (elas estão endurecendo gradualmente e alguns efeitos se fazem ver, mas o regime dos aiatolás não parece seriamente abalados); e nenhum deles cogita reformular as negociações com Teerã. Ao mesmo tempo, Obama e Romney repetem que não deixarão o país ter a bomba. Uma salada;
5) Israel é sempre o maior aliado. Obama pode ter andado às turras com Bibi Netanyahu, mas ele e Romney disputaram pau a pau para ver quem adulava mais Israel. A influência do lobby judaico é de fato impressionante, e tanto o presidente quanto o ex-governador têm judeus entre seus maiores doadores de campanha (o dono de estúdio Jeffrey Katzemberg do lado obamista; o dono de cassino Sheldon Adelson do lado romnista). Na pesquisa de religiões do respeitado centro Pew contabiliza 2% de judeus na população americana. É o mesmo percentual de mórmons (o Censo não afere religião);
6) O mundo americano é circunscrito ao Oriente Médio / Ásia Central (Afeganistão-Paquistão), com um fantasma chinês pairando em cima. Crise na Europa? Nada. Tirando a breve menção à Rússia, o continente foi esquecido no debate. A Índia foi ignorada. O extremo oriente — com exceção da China — não está no mapa dos candidatos. E a América Latina só foi brevemente lembrada duas vezes, e só por Romney, como mercado consumidor. É pouco;
7) Tão diferentes e tão iguais. Não duvido que, na prática, o mundo veja — e sinta — de forma diferente um governo Obama e um governo Romney (e aí você escolhe seu favorito como o mais capaz). Mas que as propostas apresentadas pelos dois são parecidas demais em quase todos os temas, são. Obama, apesar de seu Nobel, não é tão ]pacífico assim; e Romney, que acusa o presidente de falhar, ainda não conseguiu sugerir um caminho diferente, limitando-se a dizer, na maioria dos assuntos, que “faria melhor”. Só não disse como.
Luciana, fica-me a impressão que uma vitória do Romney se traduziria num aumento da tensão internacional, principalmente por seu apoio incondicional a Israel. No caso do Obama creio que a adulação a Israel é mais eleitoreira, pois na prática ele já mostrou disposição em frear os excessos de Netanyahu.
O americano médio realmente não se interessa muito por política internacional, mas o resto do mundo é afetado por ela e as posições do Romney são preocupantes, principalmente por ainda não sabermos quem realmente teria influência de fato no seu mandato.
É, talvez as tensões se elevem, mas ainda não dá para saber quão irredutível o Romney realmente seria. Abs.
O debate realmente não tem muita valia, até porque, a ênfase maior foi em fazer rir, no mais Romney tenta ter um discurso técnico, ficando um pouco distante de seu objetivo, e Obama, como o refrão “We can” fez um relativo sucesso usa outros refrões menos emblemáticos.
Me parece que Romney é um pouco mais autêntico que Obama, o que ele disse sobre o Irã mostra que ele não está tendo “orientadores”, ao contrário de Obama que tem um think tank inteiro por trás do que ele fala.
Obama é belicoso… quem está por trás da “primavera árabe” é o seu governo, quem iniciou o bombardeio sobre a Líbia foram aviões do EUA, e a rebeldia dos “rebeldes” sírios depende decisivamente a ajuda do EUA.
Em termos de idéias, na minha opinião, a coisa já está fechada a muitos anos, no EUA não existem mais o PD e o PR, agora são situação e oposição, direita e esquerda, “liberais” e “conservadores”… a hegemonia projetada por Gramsci tomou conta de metade do EUA, e esperará pacientemente, outros 60 anos se for necessário, para tomar conta do resto.
Achei o texto muito bom!
Que bom que vc gostou, Franze. Concordo com a maioria das coisas que vc disse, sobretudo a respeito da polarização oca.
Meus adendos: o Romney tem, sim, orientadores — ambos os candidatos têm sua equipe de orientadores e são explícitos sobre isso. Siceramente, acho até uma boa coisa, pq ninguém pode dominar todos os assuntos. E sobre a Primavera Árabe, não entendi se vc quis dizer que o governo do Obama começøu o movimento em si ou o levou para onde chegou. Obviamente os EUA não começaram a onda de revoltas, que se iniciou na Tunísia e depois foi para o Egito, onde os EUA não interferiram. Agora, que a Líbia continua zoneada e que a opção pelos bmbardeios foi questionável, isso sim. Ainda assim, queria registrar que amigos meus que cobriram o conflito acham que, de todos os males, o desfecho que teve foi o mal menor. Abs!
A polarização é um grande mal para o EUA… o EUA era a melhor democracia real, hoje não é mais, hoje existe luta ideológica no EUA, o maior mal da humanidade, na minha opinião.
Sobre orientadores, sim, sei que Romney os tem, mas, o que quero dizer é que Romney não os segue a risca, servem apenas para orientação, Obama não, Obama foi gerado pelos “pensadores” e segue o que eles dizem.
Os orientadores deveriam servir apenas para orientação… quando o líder quisesse saber algo ele os consultaria, e não o contrário, era assim no passado, era assim com Kennedy, Churchill, por exemplo.
Acontece que o cenário mudou… hoje existem os “debates”, nada mais que um circo na mídia, e os “contentores” devem estar afiados, sabidos, para agradar a platéia… por isso precisam de muitos de orientadores (no caso de Obama são muito mais que isso), na vida real, quando estiverem sentados na Casa Branca, não lembrarão de nada, mesmo porque na vida real as barreiras para se realizar intenções são enormes.
As ondas de revoltas começaram juntas… na Tunísia, na Líbia, no Egito e também na Síria, onde os “rebeldes” iniciaram os ataques a maios de um ano.
Observe os acontecimentos Luciana, os “rebeldes” apareceram de repente… mas, já estavam equipados e armados, na Tunísia eles tinham caminhonetes novas com metralhadoras pesadas instaladas em cima, tinham lança foguetes e tudo o mais … onde eles conseguiram isso ?
Isso custa uma fortuna!
Outro detalhe… ninguém sabia quem eram eles, mas, o apoio da mídia ocidental e do EUA, França, UK, etc foi imediato!
Na ONU já estava tudo preparado pára gerar resoluções e as ONGs respectivas de defesa dos “direitos dos civis” estavam instaladas.
A orquestra toda estava pronta para começar a tocar.
No Egito ninguém tinha o menor conhecimento de quem estava fazendo a coisa, mas a mídia apoiou plenamente e ainda criou a ilusão de que a coisa tinha sido feita no facebook … ridículo!
Hillary, a tola, ficou tão surpresa com o assassinato do embaixador que se traiu…. ela disse com olhar tristonho – “como pode uma cidade que ajudamos tanto fazer isso ?!”
Tudo está zoneado … muito mais que antes, o que virá da “primavera árabe” vai explodir o OM e o resto a médio prazo, até a irmandade muçulmana e congêneres se instalarem adequadamente no poder.
Existe um detalhe nisso, o Irã não se pronunciou contra as “revoltas democráticas”… porque sabe que não vão existir democracias em lugar dos ditadores, vão existir republicas islâmicas.
E Israel, rodeado de republicas islâmicas estará a um passo de ser extinto, pois antes ele ganhava guerras porque eram convencionais, hoje não mais, e ai, Israel terá que apelar para as bombas atômicas que possui.
A situação se encaminha para um mal maior, mas todos estão com olhos turvos e não veem.
Se você tiver um tempinho procure na Internet por este artigo:
“The West should be prepared–metaphorically speaking–to start stockpiling on heavy winter clothing. An Islamic ice age is about to descend upon us. Be prepared.
Why the Arab Spring Will Descend Into an Islamic Ice Age”
Steven Simpson Monday, April 16, 2012
É uma raridade!
Abraço
Correção:
de “na Tunísia eles tinham caminhonetes novas”
para: “na Líbia eles tinham caminhonetes novas”
Não sei, Alfranze, acho que sou mais otimista do que você em relação à primavera árabe, principalmente na Tunísia e no Egito. Eles não estavam armados, os rebeldes na Tunísia e no Egito nunca foram armados, aliás. Quanto à polarização, concordamos 100%. Abs!
No Egito era impraticável uma luta armada contra o exército Luciana, na Tunísia, em Kasserine, aconteceu luta armada, existiam atiradores rebeldes nos telhados, teve muita violência e muitas mortes.
O produto inicial da primavera árabe já está a mostra, islâmicos no poder.
Vamos esperar para ver… abs
Luciana,
Não é a primeira vez que Romney se refere à Síria como a “rota do Irã para o mar”. Segundo o Washington Post por exemplo, durante a campanha das primárias em fevereiro e março, Romney usou essa frase mais de 5 vezes. E, naquela ocasião como agora, foi explicado que Romney se referia ao fato de que navios de guerra iranianos usam portos sírios no Mar **Mediterrâneo** para fornecer armas para grupos terroristas no Líbano e Palestina. Na verdade, a referência à conexão marítima entre a Síria e o Irã foi feita exatamente na sequência à menção por Romney do suporte do Irã ao Hamas e Hezbollah.
Quanto ao desempenho de Romney ter sido apenas “passável”, David Gergen, Charles Krauthammer, Bill Kristol entre outros discordam. Todos conservadores é verdade, mas comentaristas respeitáveis em assuntos externos.
Eu adoro o Gergen. Acho que o Romney mostrou que segura a onda, mas política externa não é o forte dele. Obrigada pela explicação sobre as rotas. Vou colocar o adendo no post. Você viu o editorial do New York Timesontem? Não que eu esperasse que eles elogiassem o Romney, mas eles pegaram bem pesado sobre a falta de clareza de ideias dele. Abs.