Obama fala com a imprensa após seu encontro com Dilma: tão perto, tão longe (foto: Luciana Coelho/Folhapress)
WASHINGTON – De tudo que foi dito por Obama à Dilma no Salão Oval, quando os dois presidentes se encontraram, na última segunda, a coisa que mais me chamou atenção foi algo que ainda não apareceu por aí: o americano confessou à brasileira que, a seu ver, a recuperação econômica dos EUA vai ser mais lenta do que o que foi visto até agora.
E que a criação de empregos deve ficar no mesmo nível da vista em março – cerca de 120 mil vagas, o que ainda é um avanço, mas muito mais lento do que o que as 240 mil, 200 mil novas vagas vistas nos meses anteriores.
Publicamente, Obama ainda não admitiu isso. Se admitisse, assistiria a uma repercussão estrondosa nos mercados, que já trataram mal os dados aquém do esperado vindos em março.
O relato é exclusivo e foi feito por uma fonte confiável presente no encontro, que durou 90 minutos _o dobro do inicialmente planejado.
Vai, aliás, mais além — o presidente americano teria dito ainda à presidente brasileira que sabe que sua eleição dependerá essencialmente disso, e que a disputa, a seu ver, vai ser muito, muito acirrada. Ao que Dilma, numa expressão de simpatia que atropela o protocolo de não declarar apoio a candidatos, respondeu: “Gostaria muito que continuássemos a trabalhar juntos.”
Além disso, os dois líderes conversaram muito sobre o petróleo brasileiro _essencialmente, o pré-sal. Obama quer saber como os EUA podem participar mais da exploração, e, na descrição de presentes, ficou muito interessado ao ouvir que haverá espaço para empresas americanas com sede no país e para exportar maquinário no início da produção.
O outro tema sobre o qual Obama se estendeu foi etanol _os dois países, que são maiores produtores mundiais, trabalham em uma parceria para fazer álcool binacional em outros países (mais detalhes neste texto na Folha de hoje).
Ou seja, Dilma e Obama passaram quase todo o tempo falando de economia, da crise global ás possíveis parcerias. Política internacional ficou no rodapé da agenda, com os dois se limitando a apresentar suas respectivas posições a respeito de Síria, Líbia, intervenções internacionais. Sem diálogo, assim mesmo, concordando em discordar. No caso de Cuba, não houve nem resposta _apenas Dilma disse a Obama que a Cúpula das Américas terá, neste fim de semana, sua última edição sem a participação de Havana.
É bem diferente de encontros anteriores, entre eles ou seus antecessores. Bem diferente também em termos de personalidades _nem Dilma nem Obama mostram inclinação para a relação pessoal afável que mantinham Lula e George W. Bush (embora a aparente camaradagem nunca tenha se traduzido em políticas mútuas de mais vulto). Entre Dilma e Obama, visivelmente, não há espaço para descontração.
Ainda assim, a reunião desta semana mostra que, cada vez mais, o pragmatismo e o bolso norteiam a relação entre os dois maiores países da região, com pouco espaço (ou interesse mútuo ou afinidade) para um diálogo político nem iniciativas conjuntas nesta área (o jornal britânica “The Guardian” publicou um excelente artigo a esse respeito).
Ah, e uma última observação, por curiosidade: nós, jornalistas, entramos no Salão Oval para ouvir o briefing. É minúsculo e com um ar extremamente antiquado. Qualquer analogia possível com a a agenda americana para a região é mera coincidência.
(Aos leitores deste blog, um pedido de desculpas por tê-lo abandonado nos últimos dias. Verena e eu estávamos 100% por conta da visita presidencial, seus preparativos e sua repercussão .)