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Eleição nos EUA

Decisão em tempos de crise

Perfil Como os americanos votam. E o reflexo no Brasil, por Luciana Coelho

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Apostas para vice

Por Luciana Coelho
08/08/12 17:08

Ryan: um nerd para Mitt chamar de seu (foto: AP)

WASHINGTON – A Olimpíada de Londres termina neste domingo, e com o encerramento dos jogos devemos avançar mais uma casa no tabuleiro da corrida presidencial americana: o anúncio do vice de Mitt Romney.

A campanha do republicano vem tentando alimentar o interesse público no tema nas últimas duas semanas, para potencializar o resultado da escolha. Os e-mails a jornalistas sobre possíveis finalistas aumentaram, assim como o apelo ao eleitorado. Na conta dos experts, o candidato está apenas esperando o fim da maratona esportiva para não cdisputar atenção.

Na esteira das sucessivas rifas de Barack Obama para eventos com celebridades, os republicanos sortearão, entre os pequenos doadores de campanha, a chance de se reunir com o candidato e o vice. Além disso, criaram um aplicativo para celular especificamente para o anúncio, prometendo ao eleitor interconectado a notícia em primeira mão.

Meu palpite modesto: o anúncio sai dia 12. Eu acho que o escolhido vai ser o deputado Paul Ryan, de Wisconsin, autor das contrapropostas de orçamento republicanas.

Os outros três finalistas? O ex-governador Tim Pawlenty, de Minnesotta, que chegou a ser rival de Romney nas primárias (não que isso seja um problema, eis Joe Biden e Hillary Clinton aí para provar); o senador por Ohio Rob Portman e o senador da Flórida Marco Rubio. Posso estar enganada, mas nada fora desses quatro nomes parece fazer sentido em termos de estratégia política.

Os colunistas especializados reclamam que nunca estiveram tão por fora de um processo de escolha como agora. É tática da campanha, justamente para aumentar o interesse. Mas parece também um pouco de exagero dos colunistas, já que em 2008 a escolha de Sarah Palin surpreendeu a todos.

Ryan não lidera as apostas no site especializado Intrade, no qual se pode tentar adivinhar quase qualquer coisa em troca de dinheiro. Ele vem atrás dos outros três, ainda que à frente dos demais (Portman, chapa de Romney e popular em um Estado decisivo, lidera).

Meu palpite a favor dele se dá por dois motivos: existe toda uma movimentação da inteligentsia republicana a seu favor e, dos quatro citados, ele é o que melhor cumpre ao mesmo tempo o papel de complemento romnístico (assim como Pawlenty e Portman) enquanto ainda oferece algum frescor à chapa (o que seria também o caso de Rubio, seu contemporâneo de anos 70).

Ok, Ryan não tem o mesmo carisma que o senador descendente de cubanos. Mas tem mais que seu colega de Ohio, cuja sobradinha com Romney foi recentemente descrita por um analista conservador com quem conversei, Michael Barone, como ªexcessivamente chuchu” (ou “coxinha”, se você é paulistano como eu).

Mas a escolha de Palin ensinou aos republicanos — ou ao menos deveria ter ensinado — que carisma e jovialidade não são tudo.

Já Pawlenty se mostrou um aliado fiel, mão na massa, e tem apelo com o operariado branco evangélico que teme um candidato mais rico e de uma religião menos disseminada (acho bobagem julgar Romney por seu bolso ou sua fé, mas para muitos isso pesa). E experiente. E não vem do Congresso — ao contrário dos demais, pode vender com Romney a imagem de “outsider” na satanizada Washington.

Só não tem o verniz intelectual de Ryan, que consegue ao mesmo tempo ser prestigiado pela ala intelectualizada do partido e pelos ultraconservadores do Tea Party, graças a suas propostas de cortes.

E os leitores, têm um palpite ou um favorito?

** Adendo: o estatístico Nate Silver, do NYT, analisou o eventual impacto de cada possível vice sobre a candidatura de Romney. Pawlenty lhe tiraria votos. Ryan e Portman dariam mais ou menos na mesma. Rubio, considerando o peso de seu Estado, parece ser a melhor escolha na conta de Silver — outros candidatos mais bem colocados que ele vêm de lugares menos importantes no colégio eleitoral. Aqui: http://fivethirtyeight.blogs.nytimes.com/2012/08/08/how-romneys-pick-of-a-running-mate-could-sway-the-outcome/?hp

 

(Reiteradas desculpas pelo abandono de lar. Passei a semana passada escrevendo sobre comício do Obama, doadores milionários, republicanos ambientalistas e aranhas cibernéticas assassinas.)

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Mais frango

Por Luciana Coelho
31/07/12 15:56

WASHINGTON – Só um post rápido: é que amanhã será o Dia do Apreço ao Sanduíche de Frando, e o Jon Stewart resumiu bem demais toda a hipocrisia e a falta de senso de ridículo de ambos os lados envolvida no *drama* do frango antigays.

The Daily Show with Jon Stewart
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Prefeitos vs. frango antigay

Por Luciana Coelho
27/07/12 19:08

A rede de lanchonetes Chick-fil-A, cuja célebre campanha convida os consumidores a comer mais frango, alimenta polêmica nos EUA

WASHINGTON – Com Barack Obama e Mitt Romney sem muito tempo para falar de casamento gay (alguém deu uma olhada no PIB? E nas gafes da viagem do Romney ao exterior?), sobrou para os comentaristas políticos e os prefeitos país afora alimentar o mais recente imbróglio em torno do assunto.

Dessa vez, além de direitos civis e valores morais, a polêmica também envolve… sanduíches-iches de frango.

O que se assistiu nos últimos dias foi uma inacreditável sucessão de erros envolvendo os dois lados da questão após vir a tona que uma das mais amadas cadeias de lanchonete do país, a Chik-fil-A (tchic-filêi) doa dinheiro para campanhas antigay.

Indagado sobre o assunto, o presidente da empresa, Dan Cathy, confirmou as doações em entrevistas no rádio e justificou sua posição dizendo que era vontade divina. Clientes — gays e simpatizantes, famosos e anônimos — se irritaram e propuseram um boicote da lanchonete, que tem hoje mais de 1.600 unidades em 39 Estados americanos.

A posição de Cathy não é exatamente uma surpresa. Notícias sobre as doações já haviam sido divulgadas no início do ano por grupos de ativistas, e a Chick-fil-A sempre se apresentou como uma empresa que segue preceitos cristãos — nicho que aparentemente cresce no país. Isso inclui fechar aos domingos para que seus funcionários possam ir à missa/ao culto.

Da mesma forma, clientes que discordam da posição de Cathy também estão no seu direito ao deixarem de comer na lanchonete. Afinal, é o dinheiro da empresa que está sendo doado às campanhas, e é razoável pensar que uma parte do que você paga pelo seu sanduíche vai para os cofres de grupos que pregam contra aquilo em que você acredita.

O bizarro da história é como a coisa ganhou volume. E passou dos limites. Três prefeitos — Thomas Menino, de Boston, e Rahn Emmanuel, de Chicago, e o de San Francisco, Edwin Lee — insinuaram que seria bom que as lanchonetes se mantivessem bem longe de suas cidades (Menino foi mais longe, e ameaçou dificultar a abertura de uma filial).

Os prefeitos podem discordar pessoalmente da posição de Cathy — e eu também acho muito estranho pessoas que se apresentam como profundas conhecedoras da vontade divina, ainda mais se for para pregar a favor da discriminação. Mas eles não têm nenhuma base legal para vetar a lanchonete.

Se ficasse provado que a Chick-fil-A demite ou maltrata funcionários ou destrata fregueses com base em sua orientação sexual, eles estariam sujeitos a processos e multas. Isso, até agora, não aconteceu. 

Tudo que o dono da empresa fez foi dar dinheiro para uma causa na qual ele acredita, ainda que para muitos pareça absurda. Por isso, o boicote é justo da parte dos consumidores que discordam de Cathy. Mas usar o poder da Prefeitura para vetar a abertura da lanchonete em uma cidade só porque você discorda do dono da empresa, não.

Se for assim, qual o próximo passo? Vão começar a vetar Igrejas que pregam contra o casamento gay? Vão fazer questionários para saber quais os CEOs que traem suas mulheres? Submeter executivos de bancos a teste de dopping?

A polêmica cresceu na última semana, e eu estou muito curiosa para ver como isso tudo afetou as vendas do chamado “frango de Jesus” — o sanduíche é apelidado assim por fãs e detratores. A publicidade negativa foi grande, mas também provocou nos conservadores um contramovimento.

Nunca comi no Chick-fil-A, raro em Washington, para saber se é bom. Agora estou curiosa para saber se o sanduíche é mesmo bom.  Só que não quero ver meu dinheiro pingando no caixa de campanhas antigay. Tampouco quero ver prefeitos que usam seu poder para atacar os que discordam se dando bem.

Preparem-se para mais capítulos da saga do frango.

(pois é, escrevi este post durante a abertura dos Jogos Olímpicos. Graças à NBC, que comprou os direitos nos EUA mas não está transmitindo ao vivo.)

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Sobre meninos e armas

Por Luciana Coelho
24/07/12 07:00

Quadro que enfeitava um simpático restaurante familiar em Milford, Delaware

WASHINGTON – A segunda emenda à Constituição dos Estados Unidos, datada de 1791, garante à população o direito de manter e carregar armas. “Sendo uma milícia bem regulada necessária para a segurança de um Estado livre, o direito das pessoas de manter e portar armas não deve ser infringido.”

Em tempos de tiros em Aurora, vale evocá-la.

A Constituição dos EUA é uma espécie de livro sagrado. Questionar o anacronismo de algumas de suas proposições — como o porte de armas em uma época em que o país, recém-independente, carecia de um Exército de fato — é uma heresia passível de pena de morte política, mediante a acusação de traição à Pátria. É também um documento perfeito, e exercícios para interpretá-lo não raro terminam em celeumas nacionais e trocas de acusações graves.

Portanto, não veremos o presidente nem seu adversário republicano, Mitt Romney, desferindo qualquer pergunta a respeito do documento que possa soar como ofensa. Na página de campanha de Barack Obama, não há menção ao assunto. Na de Romney, há um tópico “Direito às Armas”, com uma defesa da segunda emenda.

Após a chacina de Aurora, o republicano afirmou que mais controle não faria diferença no desfecho. Já o democrata admitiu que mais critérios na hora de vender poderiam ter evitado que o suspeito, James Holmes, tivesse acesso à parafernália que teve. Mas nada que realmente atente contra aquilo que a Constituição garante.

Ironias à parte, eu sou fã da Constituição americana. Admiro que eles não tenham entulhado o documento com 789 emendas nem o tenham refeito a cada mudança do vento. Mas considerá-lo como algo escrito em pedra, imutável, pronto para ser interpretado ao pé da letra para todo o sempre me parece tão lógico quanto qualquer fanatismo religioso.

Além do contexto histórico, é preciso levar em conta que em uma sociedade menor, é mais fácil saber o que cada um faz com sua arma. Ou quem está comprando armas.

Estamos falando de um tempo em que existiam milícias, e elas eram necessárias. Mais ainda: em 1791, o país tinha 3,9 milhões de pessoas, das quais 900 mil — no máximo — tinham a prerrogativa do porte. Hoje, são 220 milhões (311 milhões de habitantes menos cerca de 90 milhões sem idade legal, o único critério de corte).

 Não está na hora de revisitar a segunda emenda, e impor ao menos algum tipo de critério para a venda?

Nessa hora de comoção, muita gente mira na cultura americana, na banalização da violência. Não acho que a violência esta esteja mais banalizada aqui do que em qualquer outra sociedade do lado de cá do planeta.

 Explicações fáceis surgem em profusão (e sobre isso, Vinicius Mota escreveu um bom artigo na Folha desta segunda). O problema é que elas levam o debate para o lado errado.

Sim, “É a liberação das armas” poderia facilmente entrar nessa lista: as mortes por arma de fogo nos EUA somaram 8.775 em 2010 (último dado disponível), enquanto no Brasil, um país onde o porte de arma não é liberado, foram 35.233.

Mas a questão, lá e cá, vai além da lei e além do espírito dos tempos. O debate pode ser educativo, mas a questão imediata é controle. E o ponto nos EUA é que o controle passa pela mudança na lei, já que sem institucionalização, ficaria difícil contornar a sombra da segunda emenda.

Poderíamos aproveitar a chance para debater sobre as mortes que não saem no noticiário, e as razões pelas quais elas comovem menos (identificação é a palavra-chave aí). Mas isso também seria desviar o assunto.

Qualquer chacina a menos, cá e lá, qualquer matança que pudesse ser evitada, cá e lá, deveria ser evitada.

É um exercício hipotético, mas se considerada a matemática, e se considerado que aqui normalmente se tenta fazer cumprir a lei, apostar que os EUA com controle de armas teriam menos mortes do que sem é, no mínimo, um palpite embasado. Na última pesquisa do Gallup a respeito, no ano passado, 54% dos americanos eram a favor de algum tipo de controle mais severo. Mas só metade deles o diz com todas as letras.

Não faz mais sentido usar a suposta sacrossantidade da Constituição como barreira refratária.

 *

Interessante notar que o lobby antiarmas nos EUA vem caindo, enquanto o pró-armas recuou um pouco, mas muito menos.

 Em 2010, os grupos antiarmas doaram US$ 7.600 a políticos nos EUA, enquanto o pró-armas encheram os cofres dos candidatos com US$ 2,87 milhões, 16% dos quais foram para democratas e 84%, para republicanos, segundo o Centro por uma Política Responsável.

Em 2000, seu auge, o lobby antiarmas havia doado US$ 581 mil, ou 76 vezes mais do que hoje, enquanto os pró-armas doaram US$ 4,3 milhões, menos que o dobro. Em dez anos, relação entre um e outro passou de US$ 1 antiarma contra US$ 7,40 pró-armas para US$ 1 antiarma contra US$ 377 pró. Alguma ideia do porquê? 

* O título deste post é uma alusão ao diretor Clint Eastwood, conservador, durão e a favor do controle de armas. 

(Se você clicou em busca da cobertura do massacre do cinema, leia aqui a ótima reportagem do Raul Juste Lores no Colorado.)

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Animais políticos

Por Luciana Coelho
18/07/12 14:34

Nem terninhos nem saias rodadas para Sigourney, a eterna Ripley, no Departamento de Estado (divulgação)

WASHINGTON – Ela é ambiciosa, durona, foi primeira-dama e tentou, sem sucesso, a Presidência. Democrata de centro, acabou como secretária de Estado, quando viu sua imagem de megera se converter em uma das figuras políticas mais populares do país. Ele, um ex-presidente de sotaque sulista, está um pouquinho acima do peso, é carismático, populista e mulherengo que só.

Não fosse pelo divórcio logo após as primárias partidárias frustradas, e pelo figurino sexy-depois-dos-60, ela poderia ser chamar Hillary, e ele, Bill.

Mas não. É Elaine Barrish Hammond, a personagem vivida por Sigourney Weaver em “Political Animals”, a série sobre uma família entranhada no poder que o canal USA estreou por aqui no domingo. O (ex)marido, Bud Hammond, é interpretado por Ciaran Hinds (o César da série “Roma”, em versão mais rechonchuda e umas notas além no sotaque).

Weaver, que andava meio perdida em chatices como “Avatar”, brilha ao compor uma personagem que não se des-feminiliza para parecer mais forte nem cai em caricaturas para mostrar que tem um lado afável.

Sua antagonista é uma jornalista também ambiciosa, também durona e também traída encarnada por Carla Gugino, o que me faz pensar que a série talvez se trate mais de mulheres no poder do que sobre um drama familiar apimentado.

A trama começou meio novelesca, marido traidor, filho dependente químico, outro filho à beira do casamento, mãe falastrona, montes de sexo, tudo um pouco carregado nas tintas para o meu gosto (a foto promocional da personagem de Gugino, Susan Berg, me deu um nojinho).

Mas a personagem central é muito boa, por nos fazer questionar os estereótipos a que as mulheres se submetem para entrar na política.

 Pense nas líderes mundiais, ou nas figuras políticas de projeção. Quase sempre seus nomes vêm associados a predicados como “muito dura”, ou “age como um homem”, ou “muito mulherzinha”, ou “sexy e burra” (quando não “mãe” de qualquer coisa). Ok, há exceções, mas os homens não são submetidos a uma gama tão restrita de etiquetas.

Com as políticas, há sempre uma tentativa de encaixar a fulana do lado duro ou do lado mole, masculinizá-la ou fragilizá-la — para nos limitarmos à política americana, basta lembrar do condenado choro de Hillary ou da imagem que foi construída de Sarah Palin, ainda que em parte por ela mesma. Isso se estende a qualquer continente (ok, as asiáticas, sobretudo as sudeste-asiáticas, talvez sejam exceção).

Em uma conversa há alguns anos com um professor de Harvard especializado em psicologia do eleitorado, ele me explicou que havia uma inclinação em encaixar as mulheres-candidatos em arquétipos para facilitar sua assimilação pelo eleitorado, pouco acostumado a vê-las em posições mais altas de comando. Os principais são o de mãe e o de esposa (mas, se pensarmos mais, também há o de meretriz, o de bruxa e a eterna evocação da instabilidade e da histeria).

Talvez por isso, a Elaine de “Political Animals”, que gosta de elefantes e diz “I just keep going”, seja um refresco — ao menos no primeiro capítulo. Pós-feminista, ela não precisou renegar nenhum pedaço seu –nem a dureza, nem a ambição, nem a fragilidade, nem a maternidade, nem o sexo, nem a inteligência — para se encaixar no esquema.

Pena que seja só ficção.

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O problema é dinheiro

Por Luciana Coelho
13/07/12 14:22

Na terra do capitalismo, dinheiro pode se tornar problema (foto: Reuters)

WASHINGTON – Quando fui a Utah em março, para escrever sobre a religião mórmon, um sociólogo da Igreja me mostrou, preocupado, uma pesquisa apontando que 22% dos americanos não elegeriam um mórmon presidente.

A rejeição só perdia para a de um eventual candidato ateu (acima de 50%) e empatava com a de um muçulmano (23%), à frente de negros, mulheres, judeus, católicos (que nos EUA são minoritários) e homossexuais.

Hoje, porém, o maior problema do candidato republicano Mitt Romney pode não ser sua fé, mas seu bolso: pesquisa do Gallup divulgada na quinta mostra que 20% dos eleitores se sentem menos inclinados a votar em um candidato se ele for muito rico.

Sem surpresa, para os democratas o número vai a 37%, e para os republicanos, a 4% — mas 19% dos eleitores sem filiação partidária afirmam se sentir assim. A rejeição também é inversamente proporcional à renda familiar, chegando a 28% entre os que ganham até US$ 2.000 (R$ 4.070) ao mês.

A pesquisa foi feita nos últimos dias 9 e 10, com 873 eleitores, o que me faz perguntar: a campanha de Obama, que acusa Romney de não pagar imposto sobre o dinheiro que guarda em lugares como as ilhas Caymann, surtiu efeito?

Os Romney mantêm uma empresa registrada na ilha, como mostra a declaração de renda do candidato de 2011. Também fecharam, no passado, uma conta na Suíça. Em ambos os casos, dizem pagar impostos em dia.

Os democratas parecem ter achado um flanco vulnerável aí para atacar Romney, e o republicano, com suas gafes como “vamos apostar US$ 10 mil” ou “entendo um pouco de Nascar porque meus amigos são donos de escuderias”, não ajudou. Em toda oportunidade que tem, o presidente gosta de lembrar da riqueza do rival.

Com a questão religiosa totalmente fora do jogo de baixarias, parece ser um caminho a explorar. E como os democratas têm explorado. Obama defende que o problema não é Romney ser rico, mas se ele paga impostos em dia e se investe no país, como diz investir.

Ok, a pergunta é pertinente da forma como o presidente coloca, mas a questão parece ir muito além. Os marqueteiros democratas, a meu ver, captaram outra questão subjacente aí, talvez mais interessante:

Cinco anos de crise e um aumento histórico na desigualdade social  podem estar produzindo efeitos mais profundos nos EUA, um país onde nunca foi pejorativo ser rico (pelo contrário, histórias de sucesso nos negócios são louvadas por aqui — e, se Romney veio de família rica, é verdade também que ele multiplicou seu capital).

Os democratas parecem ter captado essa mudança mais profunda, mas, por enquanto, só para usar eleitoreiramente. Já os republicanos, se captaram, não parecem ver aí um problema. De qualquer jeito, estamos mal.

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Obama atrá$

Por Luciana Coelho
10/07/12 00:55

Em comício em Ohio na última quinta, Obama estreou o slogan “apostando na América” (Associated Press)

WASHINGTON – Não bastasses as más notícias vindas da economia e o impacto delas sobre o bolso – e o voto – do eleitor, a campanha do presidente Barack Obama tem um motivo a mais para se preocupar com cifrões. Em junho, sua arrecadação foi recorde, e ainda assim ficou aquém da do republicano Mitt Romney.

De acordo com dados divulgados pela campanha nesta segunda, Obama levantou US$ 71 milhões (cerca de R$ 142 milhões) no mês passado. “Bravo, isso é impressionante”, escreveu sua campanha no site oficial. Só que Romney conseguiu US$ 106 milhões — exatamente 50% a mais.

O descolamento era esperado com a definição de Romney como candidato republicano, no mês anterior. Com a unificação do partido em torno do nome do ex-governador de Massachusetts, seria mesmo natural que todos os financiadores republicanos focassem nele. Mas 50% é muito.

 Com isso, soou o alarme na campanha obamista.

Uma questão a se pensar é se a base de financiamento de Obama, mais calcada nas doações de pequenos valores (até US$ 200) do que de costume, se sustenta com o poder de fascinação do presidente em baixa. Em 2008, o democrata — ou seus estrategistas — foram considerados revolucionários por desenvolverem o modelo capilarizado e internet-centrado.

Neste ano, quase 43% das doações até maio vieram desses pequenos doadores, segundo rastreamento do Centro por uma política responsável. No caso de Romney, apenas 13% teve origem semelhante. Mas bem ou mal a máquina republicana está se provando mais efetiva.

A popularidade de Obama está em 45%, segundo o Gallup; não chega a ser excepcionalmente baixa, mas está longe de deixar o atual ocupante da Casa Branca em situação confortável. Com a economia ainda se debatendo para sair da crise, é natural que o cidadão comum pense duas vezes antes de pôr dinheiro na política.

 Enquanto isso, o caixa de Romney segue saudável. Por conta das primárias, seu saldo é menor do que o do rival (US$ 227 milhões contra US$ 326 milhões, mas com o ritmo de captação atual vai acabar passando-o).

Esse dinheiro é crucial na hora de comprar espaço na TV para comerciais de campanha, e comerciais de campanha são fundamentais em Estados-chave. Além disso, os dois candidatos contam com PACs e superPACs (esses últimos, operando numa brecha da legislação eleitoral) para fazerem o trabalho sujo — os comerciais baixarias — por eles. Por ora, Romney conta com mais verba de PACs.

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Obamatur

Por Luciana Coelho
05/07/12 12:00

Obama busca um norte em seu ônibus de campanha (Pete de Souza/Casa Branca)

WASHINGTON — Depois de assistir à queima de fogos na noite de ontem aqui em Washington para celebrar o feriado de Independência dos EUA, Barack Obama embarcou hoje em sua primeira turnê de ônibus oficialmente de campanha.

Digo oficialmente porque ele já fez outras muitas no último ano e meio, mas elas levavam nomes bonitos e justificativas nobres como ªver de perto os problemas dos americanosº, “conhecer fábricas com empregos verdes” etc. No Brasil, equivaleria às nossas infames inaugurações de ponte às vésperas de eleição.

 Mas, oficialmente lançando a campanha, é só agora que o presidente parte, aproveitando a semana do feriado do 4 de Julho e a amornada que ela dá no ritmo de trabalho (só no ritmo de trabalho, porque os termômetros nessa terra continuam beirando 40°C).

 A viagem durará dois dias e tem como destino dois Estados-pêndulo de peso, Ohio e Pensilvânia. Estado-pêndulo é aquele que muda de preferência política a cada eleição, e portanto é disputado voto a voto (lembremos que nos EUA a eleição que vale é a do Colégio Eleitoral, para onde cada Estado manda um lote de representantes que varia conforme seu tamanho e votará, em bloco, no vitorioso em suas urnas, mesmo que essa vitória tenha margem de um só eleitor).

 No momento, as pesquisas indicam que o presidente leva vantagem em ambos, com margem de 2,6% no primeiro e de oito pontos percentuais no segundo. Confesso que para mim foi uma surpresa ver tal cenário na Pensilvânia, um Estado cuja renda ainda depende muito da combalida indústria carvoeira, para a qual Obama é um inimigo nefasto devido a suas [mais do que necessárias] regulações ambientais.

 Nos dois Estados, o foco do discurso será emprego e indústria, sobretudo a siderúrgica, com paradas no “cinturão do ferro” em Ohio e em Pittsburgh, um dos principais polos, Após a última leva de dados econômicos indicar uma desaceleração brusca da atividade industrial, o presidente deve ter muito a falar.

Segundo a campanha, o presidente vai usar a excursão (batizada de ªApostando na América) para fazer um pouco de corpo-a-corpo com o eleitor e convencê-los de que defende o crescimento econômico do país “a partir do meio”, e não “de cima para baixo”, como diz ser a plataforma de seu rival.

Curioso ver como, nos EUA, nem Obama, chamado de “socialista” tem coragem de dizer “de baixo para cima”.

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A culpa é do juiz?

Por Luciana Coelho
02/07/12 15:32

Quando as torcidas estão inflamadas, o lance é xingar o juiz (John Roberts, em foto da Associated Press)

WASHINGTON – Enquanto os termômetros aqui na capital americana marcavam 40°C na sexta-feira e fim de semana adentro, jornalistas, juristas, politicistas e toda sorte de “istas” fritavam a cabeça para entender a decisão da Suprema Corte, e do ministro-chefe John Roberts, validando na véspera a polêmica reforma da saúde de Barack Obama.

A tese em voga é que Roberts, um conservador sem pudores, teria mudado o voto na última hora para se alinhar à ala liberal do Supremo (4 dos 9 juízes) e selado inesperadamente a maior vitória política do presidente democrata até então. Os “istas” citam trechos da decisão final referindo-se ao parecer de uma juíza liberal como “dissidente” (e não da maioria, como acabou sendo).

Por que Roberts faria isso? Ninguém sabe. O que a imprensa local aqui diz é que a ala conservadora passou um mês tentando fazê-lo mudar de ideia.

Roberts tem sido aclamado como gênio por alguns (à direita e à esquerda) ao ter preservado, na argumentação de seu voto, a essência da tese conservadora de que o Congresso não pode obrigar a população a comprar nada, nem seguro-saúde.

Para o magistrado, a lei aprovada não obriga, já que o cidadão tem direito de optar por não ter proteção. Mas os que escolherem esse rumo terão de pagar pela decisão — após a correção do juiz, um “imposto”, algo que o Congresso tem, sim, poderes para criar. Não uma multa, como escrito originalmente na legislação.

Muitos analistas, de novo de ambos os lados, criticaram o Supremo por ativismo judicial e tentativa de governar de toga. Não é uma acusação nova, e o tribunal sob Roberts tem sido frequentemente alvo dela. Não me parece, porém, que o ministro-chefe tenha se lançado nessa missão, ao menos não desta vez. Sua decisão é sóbria, sem firulas.

A interpretação que mais me agrada é a de que o juiz, justamente NÃO querendo tomar partido, reafirmou o caráter constitucional da reforma, e deixou o resto para os americanos decidirem nas urnas. Para uma leiga como eu, parece justo. Cada um com seu Poder.

A reforma da saúde de Obama não é exatamente seu feito mais popular (este, a julgar pelo vaivém das pesquisas, é a morte de Osama Bin Laden — quem, em 2008, poderia supor?). Sucessivas pesquisas mostram o apoio e a reprovação empatados. Levantamento do Gallup conduzido no dia do veredicto indica que 46% concordaram com Roberts e 46% discordaram.

A coisa muda de figura quando a pergunta é a obrigatoriedade de adquirir seguro. Esta é reprovada por 72% dos eleitores, inclusive por mais da metade dos democratas.

A reforma de Obama é cheia de furos, e eu pessoalmente considero a obrigatoriedade do seguro uma coisa muito esquisita, sobretudo em um país onde a liberdade individual é tida como valor máximo, para o bem e para o mal.

Mas é preciso lembrar que o sistema aqui é uma porcaria. SIM, é uma porcaria. Eu já usei o sistema público no Brasil (ok, faz tempo), e já usei hospital privado aqui. Na minha pequena bolha, me senti menos maltratada no Brasil, embora nosso sistema também seja coalhado de falhas. E olha que aqui eu tenho um bom seguro, pelo qual pago mensalmente quase US$ 400.

O que acontece é que nos EUA, toda vez que você chega a um hospital, precisa primeiro firmar um compromisso de pagamento, por cartão de crédito, fatura, o que seja. Ninguém vai deixar de te atender, porque a lei não permite. Mas depois, fatalmente, uma fatura chegará à sua casa — mesmo que você tenha seguro, a chamada coparticipação é alta. E você deve ao hospital, não à seguradora.

Como muita gente não tem condição de pagar, o índice de calotes é alto. A revista “Economist” apurou que 50 milhões de americanos não pagaram suas contas médicas em 2009, último dado disponível. Em um país de 300 milhões, e considerando que nem todo mundo precisou ser atendido em hospital durante o ano, é um número impressionante.

Entendo o argumento conservador de que estender demais a cobertura do sistema pode dar espaço para aproveitadores. Mas pergunto: os “aproveitadores” (tanto os espertinhos quanto aqueles sem condições de pagar) não estão aí de qualquer forma, dando calote?

Um estudioso conservador com quem eu conversei, James Capretta, propõe que o próprio mercado crie alternativas para ampliar o número de americanos cobertos (por exemplo, criando tipos de planos mais simples e baratos). Parece-me muito razoável, mas até agora não funcionou.

É difícil acreditar que, sem uma ação do governo, empresas que rejeitam clientes porque eles são gordinhos ou têm bronquite, cobram mais porque são mulheres e não aceitam ninguém com uma condição grave pré-existente atinem para isso.

Talvez Obama devesse ter começado mais devagar, reforçando o Medicaid (o programa que subsidia o seguro dos que têm renda familiar de até US$ 13 mil ao ano para uma família de quatro pessoas – ou pouco mais de R$ 2.000/mês, mas tenha em mente que o custo de vida aqui é maior) e regulando melhor as empresas. Talvez.

Mitt Romney prometeu, se eleito, reverter a reforma — algo que ele não consegue fazer sem o aval do Congresso. Não é uma plataforma muito promissora, já que assistência médica é a prioridade no. 5 para o eleitorado, beeem atrás da economia, e foi seu próprio plano em Massachusetts, que também inclui a obrigatoriedade de seguro, que inspirou Obama (obrigar a comprar seguro, aliás, de socialista não tem nada).

Fato é que, boa ou ruim, a reforma de Obama está feita, e se o democrata é o pai, o juiz Roberts é o cirurgião que fez o parto. Agora é esperar 2014 para ver como o país vai se ajustar. Pior do que está, é difícil ficar.

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Despedida

Por Verena Fornetti
29/06/12 12:09

DE NOVA YORK – Hoje me despeço do blog e do posto de correspondente em Nova York. Foi um imenso prazer escrever neste espaço ao lado da LUCIANA COELHO, que continua a tocar o blog com o talento e a competência de sempre. Agradeço a todos os leitores pelas contribuições, sugestões e críticas. Agradeço especialmente aos leitores frequentes, que sempre comentam e tornam as discussões mais interessantes. Abraços e obrigada!

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